Sempre admirei os trabalhos em papier mâché que casualmente encontro nas minhas navegações pela net. Vejo esculturas e formas fabulosas, com os mais variados acabamentos e aplicadas aos mais incríveis objetos, de utilitários a decorativos. Tinha uma vontade imensa de experimentar a técnica e no início do ano acabei por inscrever-me num workshop, que pelas suas características, praticamente apenas deu para aprender a receita e o processo de enformar e tirar do molde. Isto porque era inverno, a humidade no ar estava em níveis máximos e foram precisos mais de 15 dias para que as peças executadas secassem completamente e pudessem ser trabalhadas. No fundo, fiquei com a noção dos passos principais, o que para mim era suficiente pois a minha ideia desde o início foi sempre conjugar de alguma forma a técnica do papier mâché com o patchwork e um plus que englobasse fitas e contas. Sem tempo útil para acabar as peças no decurso do workshop, acabei por trazê-las para casa "despidas" e decorá-las por minha conta e risco da forma que as tinha imaginado. Resultaram em duas taças (a mais pequena não estava no programa, foi só para aproveitar as sobras da pasta) bastante rústicas e mais decorativas do que propriamente utilitárias, devido a não poderem ser lavadas, apesar de ambas terem levado uma boa camada final de cola branca, o que sempre impermeabiliza qualquer coisa. São peças interessantes, alegres, descontraídas que me fizeram ter vontade de ir mais além. Desta vez aliei a técnica aos tecidos -que são uma das minhas paixões- talvez um dia consiga associar o papier mâché à renovação de móveis -outro apego grande que tenho na vida. Enfim, ideias não me faltam e vontade também não! Mais abaixo, deixo a receita usada e um tutorial para quem quiser se aventurar: vem aí o bom tempo, meio caminho andado para imaginar peças lindas e coloridas e as concretizar num piscar de olhos!
MESA DE APOIO INDIANA
Apesar do título que dei a esta postagem, não tenho certeza que a mesa tenha vindo da Índia, mas tendo em conta o estilo e também o fato de que a pessoa que a ofereceu passou parte da vida naquele país, é muitíssimo provável que a peça seja originária de lá. De vez em quando a minha cunhada lembra-se de me entregar o que tem lá em casa partido ou bastante estragado pelo uso, na esperança que eu faça algum milagre. Quase sempre passa meses guardado até eu me entusiasmar com o que me foi confiado, seja porque geralmente são peças que não fazem muito o meu gosto ou porque precisam de um restauro propriamente dito e não de um New look, e não sou nem pouco mais ou menos restauradora. A mesinha, dobrável, em madeira exótica trabalhada e um tampo em latão, estava partida e o verniz escuro que a cobria, não dava realce ao desenho rebuscado dos pés. Portanto a minha função foi basicamente fazer uma limpeza profunda, colar o elemento partido e dar-lhe um acabamento que conferisse leveza, no caso, cera. O resultado final pode não arrancar "uaus" de admiração e a mesinha não ser protagonista de um antes e depois impressionável, mas há peças mesmo assim, que não pedem roupagem nova, apenas cuidado e apreço. Uma espécie de afago que lhes levante a auto estima.
UMA CASA NAS ARDENAS
No final do ano passado estive na Bélgica. Gosto de lá ir quando está frio e os Marchés de Noel animam e enchem de cor e sabores as ruas. Geralmente, deambulo maioritariamente por Bruxelas, onde sinto-me (quase) uma local, porém desta vez uns amigos convidaram-nos a ir às Ardenas conhecer a casa que está na sua família há 100 anos. Das conversas que tinha com eles, ouvia com especial atenção as histórias que contavam de lá, de como tinha sido viver no seio de uma família numerosa, numa casa rústica e de modestas condições, num país de inverno rigoroso, e de como a casa deixou de ser morada da família mas passadas quatro gerações, continuava a ser ponto de encontro de avós, filhos, netos, tios e primos. De modo que, quando o carro parou à frente da casa, numa tarde de dezembro cinzenta e gelada, a impressão que tive é que eu ia ao encontro de uma velha conhecida. Ao entrar, fui imediatamente abraçada pelo calor de um velho fogão a lenha e na cozinha uma generosa mesa cuidadosamente posta, esperava por nós. As memórias são muitas e estão em cada canto: no bric a brac de objetos expostos, nos quadros que enfeitam as paredes, nas fotos desvanecidas, no piso de ardósia já gasto, nas portas que rangem ao abrir. O aparelho de televisão não existe, a internet é falha. Resta ler, pescar e dar uns mergulhos no rio que corre atrás da casa, fazer jogos no jardim que à noite os javalis invadem, desfrutar de randonnées pela natureza. Ali, as horas passam lentamente, marcadas pelos sinos da igreja do outro lado da rua. Uma vez por ano, em Agosto, todos os caminhos vão dar a esta casa, dezenas de parentes encontram-se, festejam os laços que os unem e antes de se dispersarem tiram a tradicional foto de grupo, tendo como pano de fundo a centenária fachada de pedra que tantas recordações encerra.